12/04/10

É De Noite


As minhas noites costumavam ser segredos intransmissíveis. No meio das multidões, eu erguia-me mais solitária do que nunca. Sentia trazidas pelo ar umas badaladas atordoantes que faziam vibrar o mundo, levantando uma data de pó dentro da minha cabeça.


As minhas noites faziam-se de perfumes viciantes e holofotes apontados aos meus olhos. A música era quase intolerável por debaixo da cortina de desconcentração em que me movia de um lado para o outro.
Suores estranhos vinham ter com os meus lábios e excitavam-me as asas. Eu abria o meu peito e deixava a loucura sair, dando conta das marcas só na manhã seguinte.


A minha boca provou o sabor de todos aqueles cigarros. Por amor, por complacência, por submissão. Abri a minha boca para provar todos aqueles fumos, mesmo os de quem nunca conheci. Mesmo os de quem nunca vi.
Mesmo os de quem nunca olhou.
Podia rodopiar em torno de cada par de sapatos e mesmo assim a última música ainda não teria chegado. Porque a última música nunca chega no fim.


As minhas noites costumavam ser esconderijos de dor para fugir ao sofrimento. Quem me viu certamente me compreenderá. Quem lá estava buscava também fugir a este silêncio.
Em que me afogo agora.


Mas não queria sinos monumentais a berrar badaladas nos meus ouvidos. Nem rodopiar pela noite adentro até me desmoronar. Não quero beijos insinceros de uma sede já muito regada.
O que eu quero é conquistar sem medo os meus próprios corredores. Denunciar quem sou em cada rasto no chão. E ao fim da noite, puxar para o quarto aquele


alguém


que deseje beber o fumo das minhas asas acesas.

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