04/03/11

Em Que Ano Estamos

Não sei em que ano estamos. Já não tenho sequer perguntado. O passar do tempo entedia-me quando não me aterroriza.
Oiço aviões no céu, por cima do meu quarto. Pergunto-me quanto faltará até que as bombas comecem a cair, até que eu comece a acordar sobressaltada com gritos e o cheiro do fogo.
Talvez quando o Mundo estiver prestes a acabar, eu sinta falta de casa. Talvez eu pense, pobre da minha mãe.
Esse aperto tão doloroso de impotência e gratidão, esse desejo de regressar, de redimir, de dizer: afinal sim, afinal não faz mal; quero esse aperto. No meu peito. Mas sei que só chegará tarde demais.
E que me poupem aos condescendentes sermões aqueles que saltaram sobre a minha cabeça quando eu já estava até meio enterrada no chão. Vêm agora dar conselhos e tecer nostalgias aquelas almas cinzentas que eu colori sozinha, com estas mãos. Que eu fiz crescer e nutri, com cuidados de irmã, com devoção de esposa. O que é dar amor senão fazer crescer um fruto que outros colhem e levam?

Oiço aviões. As paredes vibram docemente enquanto os sinto planar sobre mim. Talvez se julguem uma promessa de fim, mas eu ainda estou à espera que tudo comece.
Como são amargas as palavras de um coração doente. Como é feia a desilusão sempre derramada no meu papel.
Mas não quero pena
não quero que me segurem
não quero ouvir arrependimentos
nem quero saber em que ano estamos.

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