29/08/10

The Prince and The Night


«The prince went slowly through the forest. His beautiful horse was silent. The sky was taking on the color of roses. "Will I be in time?" the prince wondered. He remembered what the magician had told him - "Night is your only enemy."»

Esta Voz

Esta voz diz-me que sorria aos rostos do passado para que eles pensem que sempre me conheceram.
Diz-me para me comportar com decência para que eles me evoquem com benevolência nos seus burburinhos.
Diz-me que baixe a cabeça e peça perdão pelos passos que errei dentro das vidas alheias.
Diz-me que carregue as culpas até ao fim do Universo e seja a última alma a atravessar o Estige.


Esta voz quer-me morta. E sem razão.
Esta voz quer-me submissa. Para poder ser comida.


Mas eu tenho um orgulho que não me deixa sucumbir - por muito deselegante que isso pareça aos olhos dos mais desfavorecidos em imaginação.
Ressuscitei incontáveis vezes, a pão e água salgada, revivendo cada rasteira e cada empurrão. Tenho berros para berrar e segredos para explodir em cima de todos os que juraram guardar os meus. Os que juraram amar os meus.
Vejo-me a sós, apenas com esta voz. A carregar na cabeça todos os olhares maldosos.
Ser mal vista é não ser vista. É nunca ter sido vista. É ser invisível.


Não me importa nada disto. Doendo-me, não me importa. Porque vivo com uma verdade que fala mais alto que todas. Mais baixo e mais alto. No fundo. Como Deus. Como a terra. Como nascer.

Não preciso de tapar os ouvidos.

Esta voz quer-me morta. Sem razão.
Esta voz quer-me submissa. Para poder comer-me.
Pois esta voz que morra à fome.

25/08/10

"An honest man is always in trouble."


Hal Hartley,
in Henry Fool

Goals

Entre o passado e o futuro, entre o real e o irreal, entre o que é certo e o que é errado, o que é belo e o que fere, entre o que se pensa e o que se vê, entre o que se tem e o que se perde, a vida é um mero sonho. Um breve, confuso, assustador, extasiado sonho. Em que nos debatemos sobre o que vamos jantar, se queremos ter filhos, se somos bondosos, se somos capazes, enquanto os segundos passam cada vez mais depressa, numa doce e fútil debandada para o final.

Não regressaremos jamais ao parque, à chuva, ao beijo, ao odor, ao primeiro passo, ao mais grandioso choro, ao agora. Ao aqui.
Mil mortes em cada piscar de olhos. Mil mortes em cada foda vazia. Mil mortes no gesto de apontares o dedo à sandes que queres comprar no cartaz iluminado do café. Mil mortes em ti. No Universo. Mil animais tombados. Mil máquinas desligadas. Mil filmes terminados. Mil luzes apagadas em misteriosos quartos de hotel. Em cada segundo se perece, fatigado, rendido, para sem se notar se renascer no próximo piscar de olhos de alguém.
Como percorrer condignamente o sonho? Como ser capaz de fazer as perguntas, e acreditar nas respostas? Como dar um passeio no parque? Como sentir a chuva?

O que é real? O que é passado? O que está certo? Como ser bondoso? Como ser capaz?!
E como me dispor a sorver a beleza que jorra de todos os poros invisíveis do ar? Com que força? Com que prazer? Com que crença? Para quê?

21/08/10

Menos Mal



Aqui faz frio, mas muito menos.
As ruas inflamam-se a rebentar de desconhecidos. Mas menos mal.
Não existe o rugido ensurdecedor dos olhares entediados. Não me sufoca o medo de chegar a casa. Todas as tardes se prolongam no doce cheiro dos caminhos por terminar.
Aqui, ruas sem fim beijam os meus braços. Já vão longe as promessas enganadoras de abrigo. O meu único abrigo são os meus passos, porque eles não se detêm por ninguém. E AH! Como é bom não ter de esperar! Não volto a esperar. Nunca mais. Não torno a parar.


Uma chuva de luz trespassa-me enquanto caminho veloz. Todos me vêem. Não quero saber.
Que todos me vejam.
Mas ninguém me volta a reter.